A suástica e o Nazismo.

Quero deixar bem claro à você que iniciou a leitura desta publicação que ela não tem nada a ver com apologia ou qualquer forma de propaganda do Nacional-Socialismo.

Porém, seu tema é um tanto inevitável para filatelistas especializados na história postal alemã situada entre 1933 e 1945, como no meu caso. Além disso, sou professor e historiador interessado na experiência do Fascismo, que enxerga nos selos postais um potencial tremendo como recurso didático e fonte histórica.

Feitas essas considerações, vamos ao que interessa.

Estetização da política, propaganda e símbolos.

A estetização da política é um aspecto marcante do Fascismo. No caso específico do Nazismo, Vanessa Beatriz Bortulucce (2008, p. 49) explica que a estética do movimento nacional-socialista foi alicerçada em um "sistema forte e sólido de propaganda, que tinha de ser simples, dirigido às massas, e concentrado no menor número de elementos possível".

Segundo a autora, a atenção dada aos mínimos detalhes artísticos, estéticos e propagandísticos do movimento foi iniciada com Hitler, a partir do momento em que ele passou a desempenhar um papel de destaque dentro da organização nazista (BORTULUCCE, 2008).

É atribuída a ele a criação dos dois principais símbolos nazistas: a bandeira tricolor e a suástica, em 1923 (BORTULUCCE, 2008).

Um símbolo e suas múltiplas interpretações.

A cruz gamada ou suástica talvez seja um dos símbolos políticos mais conhecidos pelas pessoas. Especialmente, pela visibilidade pública que ela possui e por um certo uso banalizado nos embates políticos que fazem parte do cotidiano, especialmente através das redes sociais.

Entre 1. de novembro de 1933 e 20 de abril de 1945, a suástica foi um elemento iconográfico recorrente nos inteiros e selos postais emitidos pelos correios da Alemanha. A filigrana tipo Wz. 4, usada na maioria das séries comemorativas, oficiais e regulares emitidas durante o período era composta por suásticas. Diversas marcas postais, tais como carimbos comemorativos, flâmulas e franquias mecânicas eram ilustradas com suásticas nítidas ou estilizadas.

Detalhe de uma folha de um álbum de selos postais do Terceiro Reich, com destaque para os dois valores que formam a série comemorativa alusiva ao Nürnberger Parteitag de 1936, lançada em 3 de setembro de 1936. Coleção do autor.

Carimbo comemorativo e flâmula de propaganda do Nürnberger Parteitag ou Reichsparteitag der NSDAP de 1938. Coleção do autor.

A suástica se fazia presente em elementos originalmente nazistas, como nas imagens acima, alusivas às emissões relacionadas ao congresso anual do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães realizado na cidade de Nuremberg. Ou, através da nazificação de símbolos civis e militares de entidades alemãs a partir de 1933, a exemplo da Cruz Vermelha Alemã.

Mas, quais são suas origens e significados?

Desde o seu aparecimento, no começo da década de 1920, a apropriação nazista da cruz gamada é interpretada de diferentes formas.

Bortulucce (2008) chama atenção para o fato da suástica além de ser extremamente antiga, foi recorrente em diversos povos situados em diversos lugares do mundo, em diferentes continentes e épocas.

A interpretação de Wilhelm Reich.

Que tal conhecermos uma dessas interpretações? Mesmo que de forma superficial?

Wilhelm Reich (1974), no livro Psicologia de massa do Fascismo, publicado originalmente em 1933, dedicou um breve capítulo à interpretação da suástica ou cruz gamada, como denominada na obra.

De acordo com ele, "o símbolo da bandeira", isto é, a suástica, foi o símbolo nazista mais impressionante desde os primórdios desse movimento.

"Por que razão esse símbolo se adequa tão bem a suscitar sentimentos obscuros?", indaga Reich (1974, p. 95).

"Hitler diz que é um símbolo de anti-semitismo. Ora, a cruz gamada só muito tarde se tornou isso", responde o autor (REICH, 1974, p. 95).

Foi em uma certa "história" da suástica que Wilhelm Reich (1974) procurou responder sua indagação. Através de uma série de autores, ele situou as origens da cruz gamada como um símbolo inicialmente sexual, que ao longo do tempo recebeu diversos significados.

A cruz gamada ou suástica, na óptica de Reich (1974, p. 97), é uma referência ancestral à "pulsão sexual".

Portanto, o movimento nacional-socialista se apropriou de um símbolo que há milênios fazia parte de um certo inconsciente.

Contudo, o autor enfatiza que:

"Essa incidência da cruz gamada na vida afectiva inconsciente não é evidentemente a causa, mas simplesmente um adjuvante poderoso para o êxito da propaganda de massa fascista" [grifo meu] (REICH, 1974, p. 97).

Um "adjuvante" poderoso até hoje.

Referências.

BORTULUCCE, Vanessa Beatriz. A arte nos regimes totalitários do século XX: Rússia e Alemanha. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2008 (História e Arqueologia em Movimento).
REICH, Wilhelm. Psicologia de massa do Fascismo. Porto: Publicações Escorpião, 1974 (Biblioteca de Ciência e Sociedade; v. 1).

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